A via da Concessão de Uso Especial para fins de Moradia como forma de regularizar posse sobre bem público
A Constituição Federal de 1988 consagrou o princípio da função social da propriedade e reconheceu a moradia como direito fundamental (art. 6º), mas veda a aquisição de bens públicos por usucapião (art. 183, §3º).
Essa vedação gerou a necessidade de criar instrumentos jurídicos que viabilizassem a destinação social de imóveis públicos ocupados irregularmente.
Nesse cenário surgiram os procedimentos da concessão de uso especial para fins de moradia e a concessão de direito real de uso, ambos incluídos no rol dos direitos reais pelo art. 1.225, incisos XI e XII, do Código Civil. Neste artigo falaremos da concessão de uso especial para fins de moradia.
Tal instituto atua como alternativa legal para garantir o acesso à moradia e o melhor aproveitamento do patrimônio público.
Criada pela Medida Provisória nº 2.220/2001, a concessão de uso especial para fins de moradia tem como objetivo permitir que famílias de baixa renda permaneçam em imóveis públicos urbanos, desde que preencham os requisitos legais. São eles:
- Imóvel público urbano de até 250m²;
- Uso do bem para moradia própria ou familiar;
- Posse pacífica, ininterrupta e sem oposição por no mínimo 5 anos;
- O ocupante não pode ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural;
- Os 5 anos de posse devem ser contabilizados até o dia 22 de dezembro de 2016;
- O titular não pode receber mais de uma vez o benefício;
O tempo de ocupação de antecessores pode ser somado ao do atual ocupante, desde que tenha ocorrido até 22 de dezembro de 2016.
Como se vê, os requisitos são muitos semelhantes aos da Usucapião; a diferença reside na limitação temporal (posse de 5 anos comprovada até 22/12/2026) e o objeto de regularização não ser a titularidade, mas o uso. Ou seja, o beneficiário não se torna proprietário do imóvel, mas sim titular de um direito real de uso, visto que imóveis públicos não são passíveis de usucapião.
A proteção concedida tem caráter social e visa impedir a remoção arbitrária de famílias vulneráveis.
O procedimento
Existindo o cumprimento dos requisitos acima descritos, o interessado poderá solicitar a concessão perante o órgão competente da administração pública municipal (estabelecido por lei municipal). O órgão terá o prazo de 12 meses para decidir sobre o pedido, contado do protocolo.
Caso haja deferimento administrativo do pedido, será entregue ao requerente um termo de concessão de uso especial para fins de moradia. Se não houver decisão administrativa no prazo acima assinalado, o interessado poderá ingressar judicialmente. Neste caso, o título registrável será um mandado ou uma sentença declaratória e concessão, nos termos do art. 167, I, 37, da lei 6.015/73.
Em ambos os casos, o título, seja termo administrativo, seja sentença ou mandado judicial, deverá ser levado a registro no ofício de registro de imóveis da circunscrição do bem, para gerar oponibilidade erga omnes, isto é, gerar publicidade e direitos oponíveis à terceiros.