O artigo 108 do Código Civil traz a possibilidade de se fazer negociações de compra e venda de imóveis que possuam valores de até 30 salários mínimos vigentes no país. Vejamos:
Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.
Como se vê, a regra é pela necessidade de escritura pública, porém, abre-se a possibilidade de dispensá-la quando o imóvel for de valor inferior a 30 salários mínimos.
Agora, e qual o valor que de deverá ser levado em consideração, o valor atribuído pelo fisco ou o valor do negócio declarado pelas partes?
O tema já foi objeto de análise pelo Superior Tribunal de Justiça, onde restou entendido que a regra do art. 108 deve ser lida com foco no valor de avaliação do bem pelo Fisco e não no valor atribuído pelas partes na negociação, senão, vejamos a decisão.
RECURSO ESPECIAL – PROCEDIMENTO DE DÚVIDA SUSCITADO PELO OFICIAL DO CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS – DISCUSSÃO SOBRE A INTERPRETAÇÃO DO ART. 108 DO CC – PROCEDÊNCIA DA DÚVIDA NAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS – ENTENDIMENTO PELA NECESSIDADE DE ESCRITURA PÚBLICA PARA REGISTRO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL CUJO VALOR DA AVALIAÇÃO PELO FISCO FOI SUPERIOR A TRINTA SALÁRIOS MÍNIMOS, AINDA QUE O VALOR DO NEGÓCIO DECLARADO PELAS PARTES TENHA SIDO INFERIOR. INSURGÊNCIA DA EMPRESA REQUERENTE DO REGISTRO.
Hipótese em que o Oficial do Cartório de Registro de Imóveis suscitou dúvida ao Poder Judiciário, referente à interpretação do art. 108 do CC.
O oficial cartorário e a empresa requerente do registro divergem quanto ao valor a ser considerado para fins de incidência da regra legal em questão: para aquele, a escritura de compra e venda deve ser feita por instrumento público, já que o fisco municipal avaliou o imóvel em valor superior a 30 (trinta) salários mínimos; para esta, a escritura de compra e venda pode ser feita por instrumento particular, pois o valor do negócio declarado pelas partes no contrato foi inferior a 30 (trinta) salários mínimos.
As instâncias ordinárias entenderam que o valor a ser considerado, para fins de aferição da necessidade de escritura pública no caso concreto, não deve ser aquele declarado pelas partes, mas o da avaliação realizada pelo fisco, destacadamente quando o propósito dos interessados e a finalidade precípua do instrumento é a transferência de propriedade do bem, e não apenas o de retratar uma mera transação.
- A interpretação dada ao art. 108 do CC pelas instâncias ordinárias é mais consentânea com a finalidade da referida norma, que é justamente conferir maior segurança jurídica aos negócios que envolvem a transferência da titularidade de bens imóveis.
- O art. 108 do CC se refere ao valor do imóvel, e não ao preço do negócio. Assim, havendo disparidade entre ambos, é aquele que deve ser levado em conta para efeito de aplicação da ressalva prevista na parte final desse dispositivo legal.
- A avaliação feita pela Fazenda Pública para atribuição do valor venal do imóvel é baseada em critérios objetivos previstos em lei, refletindo, de forma muito mais consentânea com a realidade do mercado imobiliário, o verdadeiro valor do imóvel objeto do negócio.
- Recurso especial desprovido.
(REsp 1099480/MG, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 02/12/2014, DJe 25/05/2015)
Portanto, imóveis com valores de até 30 salários mínimos estão dispensados de escritura pública, mas o valor que deve ser observado para fins de dispensa é aquele atribuído pelo fisco, o qual – em tese – reflete, ou melhor se aproxima, do verdadeiro valor de mercado do bem.